quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Avaliação 3 de Literatura Brasileira

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ARCADISMO

CONTEXTO HISTÓRICO


A Europa do século XVIII se caracterizou por profundas mudanças. Temos:
1- A lei da gravidade descoberta por Newton (1642-1727).
2- Abordagem das leis das sensações pela Psicologia.
3- Classificação dos seres vivos pela Biologia.
4- A grande quantidade de produtos  gera novas formas de comércio fortalecendo a burguesia.
5- A declaração dos direitos humanos em 1789, na França.
6- A Revolução Francesa é o ponto culminante de um processo que representa, no terreno político, a primeira grande vitória da burguesia.
7-O cultivo filosófico da razão gráfica (Emanuel Kant).
8- A concepção de que o mundo é homogênio e não heterogêneo.
 Como conseqüência temos:
a- Uma visão do mundo totalmente científico, o homem da época acredita na ciência como meio de explicar o mundo e como meio de modificar a sociedade.
b- A Razão passa a ser a base de todo saber humano, sendo assim, a religiosidade do Barroco é desprezada.                                              


Todas essas mudanças caracterizam um movimento cultural que marca a fisionomia da Europa do século XVIII : o Iluminismo. ILUMINISMO (de iluminação = esclarecimento) designa um "esforço de renovação cultural de natureza sobretudo política, que tinha em vista a atualização de conceitos, de normas e técnicas, uma maior eficiência na ordem social e se subordinava à concepção nova de progresso humano".

MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS NA LITERATURA

O estilo que predomina na literatura da época é denominado Arcadismo ou Neoclassicismo.
Arcadismo: esse nome é derivado de Arcádia, uma região mitológica da Grécia que simbolizava o ideal de vida, onde os pastores chefiados pelo deus Pan se dedicavam ao pastoreio e à poesia.
Neoclassicismo: o movimento pregava a imitação dos clássicos gregos e romanos ou ainda procuravam imitar os escritores da Renascença.

CARACTERÍSTICAS
a) Volta à simplicidade dos modelos greco-romanos, ao mundo de Camões.
b) Predomínio da razão e da ciência, esquecendo a fé e a religião.
c) Retorno ao equilíbrio, reagindo contra o desequilíbrio do Barroco.
d) Busca da perfeição da forma.
e) Procura de um estilo simples, natural, despojados das metáforas e hipérboles.  
f) Identificação da Arte com a Natureza, resultando uma poesia bucólica, ingênua.
g) Simplificação do estilo, sem perder a nobreza de linguagem.
h) Tendência introspectiva (pré-Romantismo).        
i ) Linguagem graciosa e melodiosa, com culto excessivo à Natureza (Rococó).
j ) Uso de pseudônimos pelos poetas


Em 1768 foi publicado no Brasil as Obras Poéticas de Cláudio Manuel da Costa, dando início ao Arcadismo. O século XVIII no Brasil é considerado o Século do Ouro devido as extrações deste metal e de diamantes. O eixo econômico do país desloca-se:

ARCADISMO NO BRASIL

(1768-1836)

 

 

 

1º- para Minas Gerais, centro de extração do minério
2º- para o Rio de Janeiro, considerado ponto de escoamento e nova capital do país em 1763.

Portugal encontrava-se em déficit comercial por isso explorava o máximo a colônia brasileira. Os impostos sobre os minérios aumentavam cada vez mais, dando origem a uma insatisfação geral. Junto com este fato temos as influências das idéias libertárias européias trazidas pelos estudantes brasileiros recém-chegados da Europa. Esse descontentamento geral vai aumentando até culminar na Inconfidência Mineira, preparada por  um pequeno grupo de letrados, muitos deles ex-estudantes da Universidade de Coimbra.

Esse grupo de oposição política participava da produção científica, histórica e literária da época. Pela primeira vez na sociedade brasileira pôde-se falar numa relação organizada e sistemática, ainda que incipiente, entre escritor e público.

A literatura produzida então revela CARACTERÍSTICAS neoclássicas do Arcadismo Português, embora já se note preocupação em afastar-se dos modelos portugueses e uma busca de expressão nacional. Essa busca de identidade para a literatura nacional se manifesta através:                                                           
a)    do aproveitamento do indígena não mais como curiosidade, como acontecia na literatura informativa, mas como herói. Essa tendência representa a versão brasileira da apologia do homem natural, bom selvagem, proposta no Arcadismo europeu. Expressa-se principalmente na poesia épica;
b)    da incorporação da paisagem brasileira à descrição nas poesias lírica e épica;
c) da visão crítica da situação política do Brasil, principalmente na poesia satírica.

A produção literária do Arcadismo Brasileiro que tem na poesia a principal forma de expressão, permite uma divisão:

POESIA LÍRICA-  Silva Alvarenga, Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga.

POESIA ÉPICA-  Cláudio Manuel da Costa, Basílio da Gama e Santa Rita Durão.

POESIA SATÍRICA-  Tomás Antônio Gonzaga.

O Arcadismo brasileiro encerra-se oficialmente em 1836, com a publicação da obra Suspiros Poéticos e Saudades, de Gonçalves de Magalhães, que marca o início do movimento romântico.

PRINCIPAIS AUTORES E OBRAS


CLÁUDIO MANUEL DA COSTA (1729-1789)




Nasceu em Minas. Estudou Direito em Coimbra e viveu em Lisboa, onde entrou em contato com as novidades árcades.
Retornando ao Brasil, participou da Inconfidência Mineira. Preso por participar da Inconfidência Mineira, enforcou-se na prisão.
            Mantém temas barrocos: conflitos entre o tempo e a eternidade, entre a carne e o espírito, transitoriedade do amor, inconsistência dos sentimentos... numa forma neoclássica, que ele tenta tornar simples e despojada. O poeta balança também entre Portugal e Brasil. Lá fez seus estudos e passou sua juventude, ficando muito afeiçoado aos usos e costumes do povo português, nem com isso, se encantou menos com a paisagem e com os valores de sua terra.  Seu pseudônimo árcade é GLUCESTE SATÚRNIO, sendo NISE sua musa-pastora.  Introduziu o Arcadismo no Brasil com seu livro Obras Poéticas em 1768. É o melhor sonetista da época colonial.

OBRAS
O poema épico VILA RICA e OBRAS POÉTICAS.
O poema Vila Rica narra a fundação e a história da cidade, exaltando a aventura dos bandeirantes.
Seus sonetos são ricos em musicalidade, como este em que revê a paisagem de sua infância transformada pelo progresso:

                        SONETO VII
Onde estou? Este sítio desconheço:
Quem fez tão diferente aquele prado?
Tudo outra natureza tem tomado;    
E em contemplá-lo tímido esmoreço

Uma fonte aqui houve; eu não esqueço
De estar a ela reclinado:       
Ali em vale um monte está mudado:
Quanto pode dos anos o progresso!

Árvores aqui vi tão florescente,
Que faziam perpétua a primavera:
Nem troncos vejo agora decadentes.

Eu me engano: a região esta não era:
Mas que venho estranhar, se estão presentes
Meus males, com que tudo degenera (Cláudio Manuel da Costa)

TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA (1744-1810) 


Nasceu no Porto (Portugal), em 1744.
Filho de pai brasileiro e mãe portuguesa, veio ao Brasil com oito anos. Estudou com os jesuítas, na Bahia, e, posteriormente, foi para Coimbra cursar Direito. Exerceu a magistratura em Beja. De volta ao Brasil em 1782, foi nomeado ouvidor de Vila Rica. Participou da vida intelectual dessa comunidade e apaixonou-se por Maria Dorotéia Joaquina de Seixas (Marília), a quem escreveu suas liras. Preso por ter participado da Inconfidência Mineira, em 1792 é condenado a dez anos de desterro em Moçambique. Lá esqueceu seus amores e seus versos. Dedicou-se à advocacia  e morreu.
Poeta tipicamente arcádico, Gonzaga popularizou-se através da obra MARÍLIA DE DIRCEU, onde nos mostra a paixão de um pastor (ele próprio) por  Marília.
Seu nome árcade é DIRCEU. MARÍLIA é sua musa-pastora. Estilo simples, poesia espontânea, precisão vocabular, contenção e ritmo, eis as características da obra de Tomás Gonzaga.
É considerado o melhor poeta do Arcadismo brasileiro. Obras:

POESIA LÍRICA: MARÍLIA DE DIRCEU

Em Marília de Dirceu, obra composta de liras (composição poética em que se repete, a cada estrofe, um estribilho), o poeta  nos mostra a paixão de um pastor (ele próprio) por  Marília. Na primeira parte das liras, o amor é visto sob a perspectiva de uma realização completa. A segunda parte reflete os sofrimentos da prisão e resume-se ao relato da saudade entremeado por reflexões sobre justiça, humanidade e destino.

Da primeira parte das liras transcrevemos o trecho seguinte:

LIRA XXI
Não sei, Marília, que tenho      
Depois que vi o teu rosto;                        
Pois quando não é Marília
Já não posso ver com gosto.

Noutra idade me alegrava,
Até quando conversava
Com o mais rude vaqueiro:    
Hoje, ó bela, me aborrece
Inda o trato lisonjeiro
Do mais discreto pastor.
Que efeitos são os que sinto!      
Serão efeitos de amor?

Saio da minha cabana
Sem reparar no que faço;
Busco o sítio onde moras,
Suspendo defronte o passo.        

Fito os olhos na janela
Aonde, Marília bela,
Tu chegas ao fim do dia; 
Se alguém passa, e te saúda,     
Bem que seja cortesia,
Se acende na face a cor.
Que efeitos são os que sinto!      
Serão efeitos de amor?

Se estou, Marília, contigo,       
Não tenho um leve cuidado;        
Nem me lembras se são horas
De levar à fonte o gado.

Se vivo de ti distante,
Ao minuto, ao breve instante,
Finge um dia o meu desgosto:
Jamais, Pastora, te vejo
Que em seu semblante composto
Não seja graça maior.
Que efeitos são os que sinto!
Serão efeitos de amor?

Ando já com o juízo,
Marília, tão perturbado.
Que no mesmo aberto sulco      
Meto de novo o arado.

Aqui no centeio pego
Noutra parte em vão o sego:
Se alguém comigo conversa,
Ou não respondo, ou respondo
Noutra coisa tão diversa
Que nexo não tem menor.
Que efeitos são os que sinto!
Serão efeitos de amor?
.....................................

POESIA SATÍRICA: CARTAS CHILENAS

Nas Cartas Chilenas, poemas satíricos que percorrem a Vila Rica antes da Inconfidência, em forma manuscrita e anônima, o poeta critica o governador de Minas, Luís da Cunha Meneses, que aparece no texto como o fanfarão Minésio.
As cartas são escritas por Critilo (o próprio Gonzaga) e dirigidas a Doroteu (supostamente, Cláudio Manuel da Costa). Critilo, morador de Santiago do Chile (Vila Rica), faz a crítica dos desmandos do governador chileno (na verdade, Cunha Meneses). Não se deve imaginar que as cartas sejam um ataque ao regime frontal português. Nelas, Gonzaga satiriza pessoas e não instituições. Leiam um pequeno trecho da obra:

CARTAS CHILENAS (fragmento)

Passam, prezado amigo, de quinhentos
Os presos que se ajuntam na cadeia.
Uns dormem encolhidos sobre a terra,
Mal cobertos dos trapos, que molharam
De dia, no trabalho. Os outros ficam
Ainda mal sentados, e descansam
As pesadas cabeças sobre os braços,
Em cima dos joelhos encruzados.
O calor da estação e os maus vapores
Que tantos corpos lançam, mui bem podem

Emprestar, Doroteu, extensos ares.
A pálida doença aqui bafeja,
Batendo brandamente as negras asas.
Aquele, Doroteu, a quem penetra
Este hálito mortal, as foças perde,
Tem dores de cabeça e, num instante,
Abrasa-se em calor, de frio treme.


SILVA ALVARENGA (1749-1814)

Sua obra mais importante é GLAURA, pseudônimo de sua musa. Pseudônimo árcade: ALCINDO PALMIRENO. A incorporação da paisagem brasileira é uma das características da obra de Alvarenga. Confira pelos fragmentos:

1. Carinhosa e doce, ó Glaura,
Vem esta aura lisonjeira;
E a Mangueira já florida
Nos convida a respirar.

2. Mas que soberbo carro se apresenta
Tigres e antas, fortíssima amazona
Rege do alto lugar em que se assenta.
Prostrado aos pés da intrépida matrona,
Verde, escamoso jacaré se humilha,
Anfíbio habitador da ardente zona.

 
 
JOSÉ BASÍLIO DA GAMA   (1741-1795)




Nasceu em Minas Gerais. Estudou em Portugal e esteve na Itália, onde ingressou na Árcádia Romana com o pseudônimo de TERMINDO SIPÍLIO. Volta ao Brasil e novamente a Portugal, onde foi preso, acusado de estar ligado à Companhia de Jesus. Condenado ao degredo em Angola, consegue comutação da pena graças a um epitalâmio (canto ou poema nupcial) que escreveu a filha do Marquês de Pombal, por ocasião de seu casamento. Após esse fato, é nomeado oficial da secretaria do Reino, mantendo-se sempre fiel ao marquês.


Protegido por Pombal e a ele agradecido, escreveu o poema épico O URAGUAI num tom forçosamente antijesuítico. Sua obra mais importante é o poema épico O Uraguai, que narra as lutas dos índios dos Sete Povos das Missões do Uruguai contra o exército espanhol que vinha executar o Tratado de Madrid (1750), o qual transferia aos portugueses essas missões e aos espanhóis a Colônia do Sacramento. Os Sete Povos eram dos índios, dirigidos por jesuítas. Unidos, organizaram a resistência ao exército luso da chamada Guerra Guaranítica. A narrativa é entremeada por visões de Lindóia: grandes feitos de Pombal reconstruindo Lisboa destruída por um terremoto e expulsando do reino os jesuítas. Esse é o assunto que constitui o corpo do poema. Embora o tema fosse um capítulo da longa resistência indígena em nosso território, ele foi explorado com objetivo laudatório (que encerra louvor) e político. Culpando os jesuítas por incitar os índios à guerra, ele se punha do lado dos colonizadores. Tem, contudo, momentos brilhantes, descrevendo o índio como grande guerreiro e apresentando nossa exuberante paisagem.


A obra escrita em versos brancos, em cinco cantos, tem como personagens mais importantes: Gomes Freire de Andrade, comissário real português; Cepé, Tatu-Guaçu, Lindóia, indígenas; Belda, jesuíta.


O trecho transcrito a seguir mostra a morte de Lindóia. Por amor ao índio Cacambo, seu companheiro assassinado pelos inimigos, Lindóia deixa-se picar por uma serpente e morre.


O URAGUAI (fragmento)
A MORTE DE LINDÓIA


(...) na mais remota, e interna
Parte do antigo bosque, escuro e negro,
Onde ao pé de uma lapa cavernosa
Cobre uma rouca fonte que murmura,
Curva latada de jasmins, e rosas.
Este lugar delicioso, e triste,
Cansada de viver tinha escolhido
Para morrer a mísera Lindóia.
Já reclinada, como que dormia,
Na branda relva e nas mimosas flores,
Tinha a face na mão, e a mão no tronco
De um fúnebre cipreste, que espelhava
Melancólica sombra. Mais de perto
Descobrem que se enrola no seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia, e cinge
Pescoço, e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de ver assim, sobressaltados,
E param cheios de temor ao longe;
E nem se atrevem a chamá-la e temem
Que desperte assustada, e irrite o monstro,
E fuja, e apresse no fugir a morte.
Porém o destro Caitutu, que treme
Do perigo da irmã, sem mais demora
Dobrou as pontas do arco, e quis três vezes
Soltar o tiro, e vacilou três vezes
Entre a ira, e o temor. Enfim sacode
O arco e faz voar a aguda seta,
Que toca o peito de Lindóia e fere
A serpente na testa, e a boca e os dentes
Deixou cravados no vizinho tronco.
Açoita o campo coa ligeira cauda
O irado monstro, e em tortuosos giros
Se enrosca no cipreste, e verte envolto
Em negro sangue o lívido veneno.
Leva nos braços a infeliz Lindóia
O desgraçado irmão, que ao despertá-la
Conhece, com que dor! no frio rosto
Os sinais do veneno, e vê ferido
Pelo dente sutil o brando peito.
Os olhos, em que Amor reinava, um dia
Cheios de morte; e muda aquela língua,
Que ao surdo vento, e aos ecos tantas vezes
Contou a larga história de seus males.
Nos olhos Caitutu não sofre o pranto,
E rompe em profundíssimos suspiros,
Lendo na testa da fronteira gruta
De sua mão já trêmula gravado
O alheio crime e a voluntária morte.
E por todas as partes repetido
O suspirado nome de Cacambo.
Inda conserva o pálido semblante
Um não sei que de magoado, e triste,
Que os corações mais duros enternece.
Tanto era bela no seu rosto a morte!


A descrição de elementos da cultura indígena e do espírito guerreiro do nativo brasileiro contribui para a crescente fixação do caráter nacional de nossa literatura. A visão heróica de índio é um traço de sentimento nativista.


FREI JOSÉ DE SANTA RITA DURÃO (1722-1784)



Natural de Minas Gerais, foi para um seminário na Europa, se ordenou padre e nunca mais voltou ao Brasil. Sua obra mais importante é o poema épico CARAMURU (Filho do Trovão). Em conseqüência da aceitação, queima o restante de sua obra ainda inédita. Imita Camões na forma. Substitui o maravilhoso mitológico pelos milagres cristãos. O poema capta nossa história desde a lenda do naufrágio de Diogo Álvares Correia, chamado pelos índios de Caramuru, até a chegada de Tomé de Souza à Bahia. Na obra, o poeta aborda também os costumes e tradições do índio brasileiro, considerando-o inferior ao homem branco. Esse naufrágio e o socorro prestado pelos nativos levaram muitas índias a se sentirem apaixonadas por Diogo. Ele se apaixonou por Paraguaçu e dela ficou noivo. Ao viajar de navio para a Europa com Paraguaçu, desconsoladas, muitas índias perseguem a nado a embarcação. Moema a mais apaixonada, é focalizada pelo poeta com destaque. Sua luta, suas mensagens e sua morte constituem os versos mais lindos do poema, assim como ocorrera com Inês de Castro em Os Lusíadas e com Lindóia em O Uraguai.


CARAMURU (fragmento)
MORTE DE MOEMA

É fama então que a multidão formosa
Das damas que Diogo pretendiam,
Vendo avançar-se a nau na via undosa,
E que a esperança de alcançar perdiam,
Entre as ondas com ânsia furiosa
Nadando o esposo pelo mar seguiam
E nem tanta água que flutuava vaga,
O ardor que o peito tem, banhando apaga.
Copiosa multidão da nau francesa
Corre a ver o espetáculo assombrada;
E ignorando a ocasião da estranha empresa,
Pasma da turba feminil, que nada.
Uma que às mais procede em gentileza,
Não vinha menos bela, do que irada;
Era Moema, que de inveja geme,
E já vizinha à nau se apega ao leme.
"Bárbaro (a bela diz): tigre e não homem...
Porém o tigre, por cruel que brame,
Acha forças, amor, que enfim o domem;
Só a ti não domou, por mais que eu te ame.
Fúrias, raios, coriscos, que o ar consomem,
Como não consumis aquele infame?
Mas pagar tanto amor com tédio e asco...
Ah! que corisco és tu... raio... penhasco
Bem puderas, cruel, ter sido esquivo,
Quando eu a fé rendia ao teu engano;
Nem me ofenderas a escutar-me altivo,
Que é favor, dado a tempo, um desengano.
Porém, deixando o coração cativo,
Com fazer-te a meus rogos sempre humanos,
Fugiste-me, traidor, e desta sorte
Paga meu fino amor tão crua morte?
Tão dura ingratidão menos sentira
E esse fado cruel doce me fora,
Se o meu despeito triunfar não vira
Essa indigna, essa infame, essa traidora.
Por serva, por escrava, te seguira.
Se não temera de chamar senhora
A vil Paraguaçu, que, sem que o creia,
Sobre ser-me inferior, é néscia e feia.
Enfim, tens coração de ver-me aflita,
Flutuar, moribunda, entre estas ondas;
Nem o passado amor teu peito incita
A um ai somente, com que aos meus respondas,
Bárbaro, se esta fé teu peito irrita,
(Disse, vendo-o fugir) ah! não te escondas!
Dispara sobre mim teu cruel raio...
E indo a dizer o mais, cai num desmaio.
Perde o lume dos olhos, pasma e treme,
Pálida a cor, o aspecto moribundo;
Com mão já sem vigor, soltando o leme,

Entre as salsas escumas desce ao fundo.
Mas a onda do mar, que, irado, freme,
Tornando a aparecer desde o profundo,

-" Ah! Diogo cruel!" - disse com mágoa,
E sem mais vista ser, sorveu-se na água.

Choram na Bahia as ninfas belas,
Que nadando a Moema acompanhavam;
E vendo que sem dor navegam delas,
À branca praia com furor tornavam.
Nem pode o claro herói sem pena vê-las,
Com tantas provas, que de amor lhe davam;
Nem mais lhe lembra o nome de Moema,
Sem que amante a chore, ou grato gema
(Santa Rita Durão)